Caso ocorreu em Garopaba, no Litoral Sul de Santa Catarina.
O desaparecimento de 1.489 cestas básicas de Garopaba, no Litoral Sul de Santa Catarina, às vésperas das eleições de 2022 é investigado no município. Foi aberta uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) e há duas apurações no Ministério Público de Santa Catarina (MPSC).
Antes dessas investigações, já havia sido instaurado um procedimento interno pela prefeitura, ainda em andamento. Até esta sexta-feira (30), não se sabia o paradeiro das cestas básicas.
As suspeitas tiveram início em agosto do ano passado, quando moradores cadastrados pela Secretaria de Assistência Social do município como beneficiários das cestas básicas passaram a relatar a falta delas, o que se seguiu até outubro daquele ano.
Naquele mesmo mês, a Controladoria-Geral do município, sob administração direta do prefeito Junior Abreu (PP), realizou uma auditoria para, a princípio, identificar possíveis falhas na informatização de dados da secretaria e, se necessário, propor melhorias.
A partir disso, o órgão percebeu que o programa de fornecimento de cestas básicas tinha “uma grande falha quanto aos procedimentos e armazenamento de informações”, conforme registra em ofício, quando a Controladoria-Geral decidiu aprofundar a investigação.
O órgão concluiu que, de maio a outubro de 2022, a secretaria comprou 2.928 cestas básicas da empresa Elo Comércio e Serviços, ao custo de R$ 282.934,00, mas só existe comprovação de ter distribuído 1.439 delas para as famílias beneficiárias.
As outras 1.489 cestas têm paradeiro desconhecido desde então, o que fez a Controladoria-Geral levantar a suspeita de irregularidades e abrir um processo administrativo. O órgão ainda comunicou o fato ao prefeito para que formalizasse uma denúncia ao Ministério Público, o que foi feito.
O MPSC instaurou dois inquéritos neste ano. São investigadas a regularização dos serviços, o que já ocorre, conforme a 1ª Promotoria de Justiça da cidade informou à reportagem, e a eventual responsabilização de agentes públicos por possíveis irregularidades.
Antes da abertura dos inquéritos, ainda no fim do ano passado, a prefeitura exonerou a então secretária de Assistência Social, Saionara Santos, e a diretora-executiva da pasta, Daiana Araújo da Silva.
“As exonerações das servidoras, que estavam à frente da pasta e responsáveis pelas compras e entregas de cestas básicas, foram realizadas para que o julgamento ocorresse da melhor forma e para que não houvesse interferências ocorridas por ainda estarem ocupando os cargos”, escreveu a prefeitura em nota.
A gestão Junior Abreu também disse ter mudado o setor administrativo da pasta para solucionar os problemas. Afirmou ainda que as cestas que chegam à prefeitura por doação, e não por compra, têm controle regular da distribuição e não estão inclusas no sumiço.
“As cestas que recebemos em forma de doação são entregues às entidades do município, como APAE, Rede Feminina de Combate ao Câncer, Centro Espírita, já as adquiridas pela prefeitura são entregues às famílias cadastradas na Secretaria. Isso acontece pois as cestas recebidas em doação são cestas básicas simples, já as que são adquiridas pelo município são mais completas, contendo mais itens. E para não ter distinção de famílias, foi organizado dessa maneira”, disse em nota.
O prefeito Junior Abreu afirmou ver a CPI da Câmara como um processo político, embora reconheça o papel de fiscalização dos vereadores, e reforçou que a investigação do caso partiu de sua gestão.
"Quando eles finalizarem o processo, vão entregar ao Ministério Público tudo aquilo que o Executivo já entregou. Nós respeitamos o papel dos vereadores, eles têm que fazer, mas, infelizmente, está sendo levado para uma esfera totalmente política, visto que essa denúncia partiu do Executivo. Não é uma coisa que a gente jogou para debaixo do tapete, que a gente prevaricou, pelo contrário", declarou o prefeito.
"Estão levantando sumiço de cesta básica como se alguém tivesse pego ou vendido. Só que pode ter sido um problema administrativo, que o sistema não foi abastecido. Pode ter sido uma situação de notas duplicadas, o que está sendo levantado também. Pode ser que tenham sido assinadas notas sem o recebimento do produto. Então estamos levantando tudo isso no processo", disse. Por fim, declaro que, se confirmado ato de corrupção, espera a punição dos responsáveis.
À CPI, o dono da Elo, Leonardo Camilo Inácio, afirmou que todas as cestas compradas pela prefeitura foram entregues pela empresa. A assessoria jurídica da empresa reforçou isso à reportagem.
“Todas as informações foram repassadas diretamente à CPI, todos os documentos relacionados às entregas e aos pagamentos foram encaminhados à CPI mediante solicitação formal da comissão. A empresa entregou efetivamente todas as cestas básicas que faturou, essas informações foram corroboradas com o depoimento das servidoras na CPI”, disse em nota.
Em testemunho à CPI, a ex-diretora da Assistência Social, Daiana Araújo da Silva, afirmou considerar o suposto sumiço das cestas básicas um absurdo. Ela disse ter sido surpreendida com a exoneração do cargo e não saber o que pode explicar a diferença nos registros entre o que foi comprado e o que consta como entregue.
Silva disse ainda não participar da entrega das cestas e que, em algumas ocasiões, houve atrasos e falta de itens pela empresa fornecedora. A reportagem não conseguiu contato com ela.
Também à CPI, a ex-secretária Saionara Santos disse que o acompanhamento das compras de cestas ficava a cargo de Daiana, a quem não atribuiu culpa, e que se recorda de terem ocorrido atrasos da empresa fornecedora por cerca de 15 dias durante sua gestão, em ocasião em que a Elo teria alegado luto.
Santos afirmou considerar vexatória a situação a que foi exposta com o suposto sumiço e negou ter ciência sobre qualquer irregularidade. Ela reafirmou isso em contato com a reportagem.
“Na minha gestão frente à Secretaria de Assistência Social, penso não terem ocorrido irregularidades! A CPI instaurada tem por finalidade apurar a verdade dos fatos, razão pela qual entendo que somente no final, poder-se-á concluir o ocorrido. Maiores esclarecimentos poderão ser obtidos através do presidente da CPI. Sou a maior interessada em apurar a verdade dos fatos!”, disse em nota.
Apesar da normalização do serviço, o paradeiro das cestas básicas ainda é desconhecido. Diante disso, a Câmara dos Vereadores decidiu abrir a CPI em março.
"Até o momento, já ouvimos mais de 18 pessoas, entre as assistentes sociais do município, funcionárias da Secretaria de Assistência Social, o dono da empresa, que estamos investigando também, a ex-secretária e a ex-diretora" disse o vereador Nilton Batista Raupp (MDB), que preside a CPI.
"Com os depoimentos das assistentes sociais, percebe-se que existiu sempre um mal gerenciamento, mas nós também ficamos sempre com o pé atrás porque é bem no período eleitoral que houve isso, de campanha eleitoral, onde pode ser que alguém usou [indevidamente as cestas] para as suas bases [de eleitores], mas não há nada concreto ainda", disse Raupp.
Os membros da CPI têm como principal linha de investigação a hipótese de desvio.