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COLUNISTAS

Abandono afetivo: quando a ausência de cuidado se torna ato ilícito civil passível de indenização

12/11/2025 12h30 | Atualizada em 12/11/2025 13h20 | Por: André Wallace e Thays dos Santos Reis

Foi sancionada e publicada no Diário Oficial da União em 29 de outubro de 2025 a Lei nº 15.240/2025, que altera o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) para reconhecer oficialmente o abandono afetivo de crianças e adolescentes como ato ilícito civil, passível de indenização por danos morais.

A norma representa um marco histórico no Direito de Família e na proteção integral da infância e juventude, pois reconhece que o dever dos pais não se limita ao sustento material, abrangendo também o cuidado emocional, a convivência familiar e a assistência afetiva. A omissão injustificada nesse dever passa a gerar consequências legais concretas.

O abandono afetivo consiste na omissão dos pais ou responsáveis no dever de garantir não apenas o sustento, mas também o cuidado emocional, o carinho e a presença constante na vida dos filhos. A lei reforça que a convivência e a assistência afetiva são deveres parentais equivalentes ao sustento material, à guarda e à educação.

Pela nova legislação, a assistência afetiva é definida como o contato e a visitação regular para acompanhar a formação psicológica, moral e social da criança ou adolescente. Inclui também o dever de dar orientação sobre escolhas importantes (educacionais e profissionais), oferecer apoio em momentos difíceis e estar presente fisicamente quando solicitado, se possível.

Trata-se, portanto, de uma ampliação do conceito de cuidado parental, que passa a englobar a presença ativa e responsável dos pais na formação integral dos filhos.

A lei estabelece que, caso seja comprovada a omissão ou o abandono afetivo pela Justiça, os pais ou responsáveis poderão ser obrigados a pagar reparação de danos (indenização) pelo mal causado, além de estarem sujeitos a outras sanções civis.

Além disso, a norma prevê que, em casos de maus-tratos, negligência, opressão ou abuso sexual, a autoridade judiciária poderá determinar o afastamento do agressor da moradia comum, assegurando a proteção integral da criança ou adolescente.Essas disposições concretizam o entendimento de que a ausência de afeto e convivência gera prejuízos emocionais e psicológicos reais, capazes de ensejar responsabilidade civil, nos termos dos artigos 186 e 927 do Código Civil.

A lei reforça o conceito jurídico de ato ilícito, entendido como qualquer ação ou omissão contrária à lei que cause dano a outrem e gere a obrigação de indenizar. O abandono afetivo caracteriza um ato ilícito civil, cuja consequência é a reparação financeira e moral do dano sofrido pela vítima a criança ou o adolescente.

Assim, o abandono afetivo passa a ter repercussões jurídicas claras, deixando de ser apenas um comportamento reprovável moralmente para se tornar conduta juridicamente sancionável.

Antes da positivação legislativa, a jurisprudência já reconhecia a possibilidade de responsabilização por abandono afetivo. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), no Recurso Especial nº 1.159.242/SP, relatoria da Ministra Nancy Andrighi, firmou o entendimento de que “amar é faculdade, mas cuidar é dever”, inaugurando a base principiológica para a reparação civil nesses casos.

Ainda nesse viés, Rodrigues e De Aguiar (2023) observam que não há consenso pleno na doutrina e na jurisprudência sobre os objetivos da indenização por abandono afetivo, embora se reconheça que ela pode cumprir múltiplas funções. Essa indenização, além de punir a omissão dolosa nos deveres parentais, tem a finalidade de prevenir comportamentos de paternidade negligente e abandono dos filhos, conferindo ao afeto um papel central no direito de família contemporâneo.

Com a Lei nº 15.240/2025, esse entendimento ganha força normativa, assegurando que o afeto, antes apenas um valor moral, passa a ser também um dever jurídico, essencial à paternidade e à maternidade responsáveis.

A positivação do abandono afetivo como ato ilícito civil é um avanço civilizatório. O Estado reconhece que a ausência emocional causa danos reais, muitas vezes mais profundos que a falta de recursos materiais.

A lei estimula a presença responsável dos pais, fortalecendo o vínculo familiar e promovendo o desenvolvimento psicológico saudável das crianças e adolescentes. A partir de agora, negligenciar o afeto é violar um direito fundamental. O cuidado, a convivência e o amor tornam-se obrigações legais, indispensáveis ao exercício da parentalidade.

A Lei nº 15.240/2025 representa um novo paradigma nas relações familiares, ao afirmar que o afeto é também um dever jurídico.

O ordenamento jurídico brasileiro passa a reconhecer, de forma expressa, que o abandono emocional configura ato ilícito civil, passível de indenização e demais medidas judiciais cabíveis.

Trata-se de uma conquista da sociedade e do Direito, que reafirma o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana e o melhor interesse da criança e do adolescente, conforme o art. 227 da Constituição Federal.

Conclui-se, portanto, que o chamado “valor do afeto” não se refere à precificação de sentimentos, mas à afirmação de que o cuidado é um dever jurídico essencial, cuja omissão gera repercussões que exigem resposta do Estado e da sociedade.

A indenização por abandono afetivo, nesses casos, cumpre dupla função: compensar o sofrimento experimentado pelo filho e reforçar a importância da parentalidade responsável como dever ético e jurídico.

Dessa forma, a responsabilização civil pelo descumprimento dos deveres afetivos representa não apenas uma medida reparatória, mas também um instrumento de conscientização social. Ela reafirma que o vínculo afetivo é indispensável à formação da pessoa e que o dever de amar, ainda que não possa ser imposto, se traduz em condutas concretas de cuidado, presença e respeito.

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André Wallace e Thays dos Santos Reis

Direito

André Wallace, Advogado e consultor jurídico, especialista em Processo Penal e pós-graduando em Execução Penal e em D. Humanos. Thays dos Santos Reis, Advogada, Assessora Especial da Procuradoria da Mulher da Câmara Municipal de Imbituba, inscrita na OAB/SC sob o número 71.417, pós-graduanda em Direito e Processo Penal.

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